quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A múmia que não era intensa

Me disse assim: vai, escreve aí, qualquer coisa, você consegue, não sei da onde você tira tanta idéia. Apertar o play, tirar o coelho da cartola, fazer mágica, inventar histórias, elaborar bonitezas, em três segundos pegar o lápis, o papel e nem é preciso borracha, vai fluir, não é mesmo? Como se fosse fácil. Como se fosse automático. Automático é quando vejo que tô proseando em voz alta no chuveiro, faço três textos em menos de uma ensaboada, me vêem idéias claras, prontas, exatas. Saio do chuveiro, me enxugo, escorre a água, vai embora pelo ralo tudo que tinha se passado. Lá se foi o momento inspiração do dia, da semana. Tomara que um dia ele volte. E agora eu, aqui, me deparado com essa múmia de sainha rodada que me manda fazer brotar alguma coisa. Morro de raiva dela. Na verdade, morro de raiva de mim. Tô puta da vida comigo, tô puta. Não consigo falar, não consigo sentir, não consigo escrever. Esse meu vício de expressar vida intensa, acaba, sabe quando? Quando eu tô contente, quanto tá tudo tranqüilo. Esquisito, não? Escrevo tanto pra buscar equilíbrio, paz, serenidade, quando encontro, não consigo juntar frases, não consigo me juntar. Só sei ser no que é confuso, incompleto, só sei falar sobre o que não faz sentido, só sei dizer do morrer de amor que nasce em mim a cada novo relacionamento. Não consigo falar de felicidade, e da calmaria que é viver bem. Eu não quero viver bem, eu quero contraviver, contradizer, contradição. Eu quero ter raiva daquilo que não acontece nunca, quero sentir tristeza por aquilo que acontece sempre. Quero buscar alguma coisa. Estar equilibrada é estar parada, acomodada, empacada. Empacada no tédio que é ser feliz e não ter a chama acesa da impulsividade que te move pra frente, te joga do alto, te atira no chão, mas te movimenta. É isso, eu gosto do movimento. Do movimento da vida, que às vezes te dá, às vezes te tira. Do movimento das pessoas que às vezes vão embora, às vezes não saem do seu lado nunca mais. Do movimento dos sentimentos, que às vezes me fazem rir, em outras soluçar de chorar. Mas me fazem alguma coisa, entende? Da raiva e do amor, que se entrelaçam, se somam com a amizade, o desejo, a vontade, e formam um emaranhado de intensidade que move a minha vida. Só consigo ser pelo que me afeta, me inquieta, me fascina, me sacode. Respondi à múmia de saia que não ia escrever naquele dia porque não estava bem. Ela me perguntou se eu estava triste. Não, eu estou feliz, falei. Ficou com cara de quem me achava louca. Louca mesmo, respondi em voz alta.

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