quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Vício



Não tenho motivos pra desconfiar, mas ele está no banho, é uma boa hora pra checar seu celular. Confio nele, mas ele foi à padaria, poderia fuçar suas gavetas. Ele deixou o facebook aberto, é errado, mas eu poderia ler de cabo a rabo todas as suas conversas. Ele está conversando com um amigo, eu poderia ficar tranquila, mas quero ouvir a conversa. É como um vício. A vontade está ali, parada, quieta. Acho sempre que estou vivendo bem, e de repente, ele me consome. Não enxergo a realidade e alucino a fantasia. Vivo em um mundo que não condiz com minhas expectativas e com os meus discursos de "eu sou assim". Fujo de mim, resgato tudo de controlador e autodestrutivo que existe por aqui. Vou até o fim e descubro tudo o que não quero, ou eu não procuro nada e imagino cenas tão dramáticas quanto um filme mudo, onde você não ouve nada, mas cada ação parece dar um indicio do que só você pode interpretar, deixando livre as piores formas possíveis de se imaginar uma cena trágica.
Ele é cruel, me faz sentir otária quando parada, obsessiva quando em movimento, triste quando sozinha, aflita quando longe. Sigo cada passo como se ele tivesse obrigação, por nascença ou por destino, de me avisar sobre cada movimento. Ele distancia amizades, acusa inocências, distorce cordialidade. Ele vê, quase sempre, coisas sem sentido. Por ele, já chorei baixinho, já gritei sufocando minha dor entre espumas do travesseiro, já tive medo, já briguei, já calei, já provei a minha certeza, já provaram minha loucura. Já quis mudar coisas que estão paralisadas na estante do passado, já quis apagar toda a história vivida, já pedi que não existisse mais ninguém no mundo que tivesse amado como eu amo, que tivesse desejado como eu desejo, que já tivesse gostado tanto de um sorriso como eu gosto. Já implorei para que ninguém descubra essa fonte de felicidade que brota em mim. Já me cobrei "não demonstra, não demonstra, se você alarmar, vem alguém te ladrar!". Já quis matar, já quis bater, já quis sumir. Certa vez, pensei que manter uma pessoa dormindo vinte e quatro horas por dia era um bom modo de não fazer ninguém se aproximar. Já tive raiva de toda aproximação a mais de 100 metros. Já imaginei quantas aproximações não pude evitar. Já enlouqueci de não saber o que se faz quando minha presença não está presente. Já quis ser uma mosca. Já quis ser invisível. Não fui, sou transparente, e me escorre toda dor que sinto ao sentir o que não quero.
Aborreço por tanta insegurança que transborda. Estremeço por confessar que talvez isso seja mesmo, uma doença, sem cura ou desculpa: o ciúme me corroe. E o desespero bate em uma noite quente, como se minha carne estivesse mesmo em brasa. Queimando por um ódio sem sentido, de alguém que não existe, por roubar o que não é seu. Porque na verdade, não existe nada meu. Só é meu o que guardo em mim. E dentre tantas memórias bonitas e especiais, prefiro guardar a dúvida. Tento entender que cada um é dono de si e morrer de ciúme não vai fazer com que ninguém viva só para mim. Tento, por cinco segundos, depois mando esse discurso psicológico e autossuficiente pra puta-que-o-pariu. E então, alucino: por que o celular não atendeu? Por que ela te falou oi? Por que você chegou atrasado? Da onde você a conhece? Você já a beijou? Você ainda a ama? O medo que tirem seu chão faz você cavar sua própria cova.
Ciúme é suicídio, te mata aos poucos, te enterra com suas paranoias vivas e faz você perder o ar e as esperanças lentamente, até morrer, com a certeza de que sempre será infeliz. Mata seu amor-próprio, faz você existir primeiro pelo outro, depois para você. Te faz vingador, se me traírem eu também traio. Te faz depressivo, se ele me deixarem eu desmorono. Te faz violento, se chegar perto eu esgano. Só se deixa ser pelo impulso do desespero e pela angústia do desamparo. Não se enxerga o amor, não se enxerga a paixão. Na escuridão da desconfiança, as lentes de contato conseguem ver só mentiras, ilusões, delírios. Nessa busca de gato e rato, de acusações sem provas, de vítima e crápula, quem sofre mais? Quem lança aos quatro ventos o veneno ou quem recebe todo esse mal para si? O amor supera mesmo tudo? Ciúme é como erva daninha, uma vez plantado, acaba com qualquer tipo de relação. Mesmo aquelas que estavam juradas em ser para sempre um amor eterno. Não conseguimos parar no primeiro trago, é preciso fumar um maço inteiro de rancor. Não conseguimos beber uma quantidade sociável, é preciso encher a cara de hipóteses. O ciúme é meu vício. Estava limpa há três meses. Hoje, ele me rondou. Eu cedi. Sei que será uma luta diária. Mas deveria saber que entre o amor e o vício, vence, quem eu alimentar.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A bagunça do meu quarto, o caos da minha mente




          Droga, já são 10 e meia da manhã. Eu coloquei o relógio para despertar há mais de duas horas. Ele não despertou para mim, mas eu despertei para o mundo. Uma culpa maior que o Pacífico me consome, coisas como “você é mesmo uma inútil” me vêm à mente. Vejo a imagem de meus pais me dando bronca. Vejo a diretora do colégio. Vejo um coronel. Não é ninguém, sou só eu e meu superego implorando para que eu tome uma atitude e saia dessa cama. Culpa: aos quinze anos você não sabe o que é isso. O dinheiro brota, as contas magicamente são pagas, você nem imagina quanto custa sua escola ou seu tênis da nike. Eu não sei se eu estou crescendo, um lado meu insiste em fazer campanha infantil e lutar pelo direito dos super-heróis a vida toda, mas eu nunca senti a vida batendo na minha porta e dizendo “ei, quero ver você mostrar serviço” como agora, eu nunca me senti tão cobrada mesmo sendo livre, eu nunca me senti acuada. Se isso for maturidade, já caí do pé de tão madura. E agora? Por onde começar? A realidade não bateu em minha porta, entrou pela janela, estilhaçou meus vidros todos, está gritando comigo agora. Mas eu não sei para onde ir. Eu deveria ter feito tanta coisa enquanto perdia meu tempo vendo seriados americanos. Eu deveria ter feito inglês, espanhol e alemão. Eu deveria procurar experiência enquanto meus hormônios adolescentes repousavam no sofá. Eu deveria estar pensando no futuro enquanto estava muito ocupada em chorar por meu primeiro amor. Eu deveria, então, ter sido uma pessoa completamente diferente do que sou. Mas não fui, e estou aqui, sem saber como realmente se torna esse bicho adulto. Nessa selva, onde existem milhões de ameaças rondando, tudo parece querer te matar. Sei que lá na frente todos esses medos de um filhote se transformarão em garras de leoa. Mas o caminho que eu terei que enfrentar para que isso aconteça, desconheço. Como fingir um equilíbrio frente a uma entrevista de emprego? Como não gritar de raiva ao ouvir “você tem experiência”? Como convencer seus professores que o trabalho não foi entregue porque a noite passada foi mesmo complicada? Como conciliar a faculdade, o trabalho, o amor, os amigos, os inimigos, as angústias, a depilação e as unhas em vinte e quatro horas? Sobram tarefas, procura-se tempo. Como ter uma calma que não possuo? Como conseguir ser como aqueles jovens empreendedores bens sucedidos que num programa de tv qualquer mostram o holerite de cinco barões? Como ser, simplesmente, organizada? Meu quarto está uma bagunça, minha cabeça, um caos. Como conseguir ser um cidadão feliz na totalidade daquele discurso biológico-político-econômico-social-afetivo? Como saber se paro a academia ou faço terapia? Como escolher entre a aula de inglês e umas horinhas de sono no sábado? Como ser gente, em meio a tantas questões? Será que ser adulto é isso? Saber dispensar o indispensável? Saber escolher dentre as mil e uma oportunidades, somente aquelas que são possíveis para hoje, para já? Será que ser adulto é sentir sua própria voz mandar em você, te empurrar para frente e dizer a todo tempo “vamos, não podemos perder mais tempo”? Será que ser adulto é pensar no futuro, sentir que ele já chegou e você ainda está parado no mesmo lugar? São tantas perguntas que não consigo responder porque talvez, ainda não seja adulta o suficiente. Mas a angústia que se afirma e se reafirma dentro de mim é digna de gente grande. É fácil quando se é criança, porque quando se sonha em crescer sua boneca de repente é você aos trinta. Ao planejar ter uma casa, a mansão da Barbie cria vida. Ao responder a pergunta “quem você quer ser quando crescer?” tudo é válido, de motorista de táxi a piloto se avião se vai em apenas um piscar. Aos vinte e poucos a vontade de crescer, mudar, conseguir um emprego, constituir família, ter dinheiro, ter um carro, ter um guarda-roupa novo, casar, ter bebês, ser feliz, viajar no feriado, enfim, tudo agora está muito mais vivo, mas o a realização desse sonho está muito longe do concreto, do palpável. Aos vinte e poucos você entende a frase “querer não é poder”. Aos vinte e poucos a vida começa a fazer sentido. Como se de repente você estivesse assoprando as velhinhas do seu bolo de cinco anos e de repente você acorda para a vida real. E nessa vida você precisa ser capaz, você obrigatoriamente não deve surtar. Você vai ter que conseguir passar por tudo isso sem nenhum surto psicótico, sem nenhuma crise de choro, sem nenhum gole de vodka e sem nenhum cigarrinho de maconha. Porque é isso que esperam de você. É só um rito de passagem, diriam os tantos velhos que existem por aí sem saber porquê de fato estão na terra. Mas com toda adolescência do mundo, eu assumo e desespero: como é difícil virar gente grande!

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Toda a calma que eu não possuo


    
                                           E ele estava dizendo que queria me fazer feliz. Eu não estava inventando ou sonhando ou alucinando. Não, ele estava dizendo com todas as letras: eu quero te fazer feliz. E pior que o desgraçado estava conseguindo. Eu estava feliz. Mas aí vem o erro. Felicidade pra mim sempre veio junto com coração completo. E ele não estava dizendo que queria completar meu coração, ele só estava dizendo que queria me fazer feliz. E em outro dia ele disse que eu era a menina ideal pra ele. E em outro dia, ainda, ele disse que não agüentava mais essa saudade. Agora com tudo isso, vem a pergunta mais óbvia: você está apaixonada? Não, eu não estava. Não estava porque não podia estar. Porque ele disse que iria me fazer feliz, mas não disse que seria a minha paixão. E quando eu começasse a falar de amor ele correria, correria, correria tanto que só ia parar quando gritasse pra alguém na rua “aquela louca ainda está atrás de mim?” e respondessem que não, eu já o tinha perdido de vista. E então, era melhor não amar. Aí vem a pergunta idiota: por que eu não consigo ser feliz sem amar? Todas as pessoas são felizes, são completas, mas não são, necessariamente, apaixonadas. Por que meu Deus eu coloco paixão em tudo que faço? Por que eu preciso ser apaixonada pelo arroz que eu cozinho, pelo texto que escrevo, pela amiga que possuo, pela roupa que comprei? Por que essa mania de colocar paixão e prazer em tudo que entra na minha vida? Não poderia colocar outro sentimento? Tinha que ser justo essa coisa chata que é o amor? A verdade é que com essa minha mania de brilhar o olho na primeira semana eu sempre acabava com o olho lacrimejando na terceira. E com esse meu jeito de dar muito além do que eu recebia meu caixa sempre ficava no prejuízo no final do mês. E nesse lance de afugentar pessoas antes que elas quisessem pensar em se encaixar, nunca achei quem enfrentasse o medo e ficasse aqui. Houve um tempo que pensava que haveria um dia que alguém não ia ter medo. Houve um tempo que eu disse que quem não aceitasse meu jeito era melhor que se mandasse mesmo. Mas dessa vez é diferente. Porque quem chegou não deu motivo nenhum pra eu querer que vá embora. Quem tem que ir embora é essa minha pressa, pra que possa acontecer tudo em passos lentos, tudo um dia de cada vez. Tudo do jeito certo, que é o oposto do jeito que eu sempre soube fazer. Não adianta eu sair por aí atropelando tudo pra depois terminar atropelada. Dessa vez eu queria que ele me fizesse feliz por muito mais tempo do que o previsto. Dessa vez eu não queria que acabasse no primeiro mês. Dessa vez eu queria que durasse. Mas não sabia como, porque pra durar eu teria que pisar no freio e frear a língua. Dessa vez eu precisaria ter calma se quisesse ter um amor. Que estranho, amor pra mim sempre foi falta de calma. Dessa vez, se eu não fosse devagar, não chegaria a lugar nenhum. Devagar e sempre. Aos poucos. Bem diferente de mim, pra conseguir uma coisa bem diferente do que foi, pra ter uma pessoa que realmente, fazia a diferença. Simples? Difícil. Foda pra caramba. Mas era o preço que eu teria que pagar. 

domingo, 12 de agosto de 2012

Um macho de saias


   
          De repente eu me vi sendo um homem. Era uma experiência tão fora da realidade pra mim. Eu sempre fui romântica demais, sensível demais, humilhada demais. Sempre fiz de tudo por quem nada fazia por mim. Sempre ali, disposta, ingênua, na esperança de que um dia realmente aquele beijo de fim de festa se tornaria o melhor amor do mundo. E de repente virou, mas eu estava recusando. E de repente me vi dando uma desculpa qualquer só pra beber no bar da esquina com as amigas. Poxa, eu mereço, semana inteira tão estressante. Por que eu não posso tomar uma gelada? Que problema há nisso, meu Deus? E de repente me veio na cabeça que namorar é um saco, que dar satisfação é outro saco, e que ter que ficar sábado a noite falando amorzinho, docinho, bebê, meu amor, é um saco maior ainda. Não queria nada daquilo. Pela primeira vez na minha vida estava achando o jogo de futebol mais interessante do que dormir de conchinha. Sim, eu estava realmente sendo invadida por um sentimento masculino que nunca tinha experimentado: a experiência de querer ter, mas não querer sempre. E achava ridículo aquelas crises de "eu te liguei 17 vezes, custava atender?". Claro que custava porra, eu estava num papo super cabeça com as minhas parceiras e não ia parar na metade pra falar que também estava com saudade do seu cheirinho, amor. E me irritava esse ciúme exagerado, de que vou fazer bico e não vou te beijar por cinco segundos porque o patife de um ser humano que não tinha nada melhor pra fazer, disse que eu era linda. Se ele disse o problema era dele, a beleza quem via era ele, vá se entender com ele e não me assuste mais. Não me assuste com mensagens de bom dia, porque eu odeio acordar cedo. Não diga que eu sou muito especial pra você, porque ser especial na vida de alguém é um problema de uns tempos pra cá. Não me diga que quer ter um relacionamento sério comigo, porque essa palavra me assusta mais do que espantalho em plantação de tomate. Não queira entrar na minha vida, eu não te quero, eu não te quero assim. Eu queria você por um dia, uma semana talvez, e você com esse jeito seu de ir se achegando do meu lado, eu fico sem reação. Não consigo te dizer que vá embora, porque a carne é fraca, você sabe como é, um beijinho aqui outro ali não faz mal a ninguém. E de verdade, eu não quero te fazer mal. O problema não é você, sou eu, e esse meu jeito de dar desculpas esfarrapadas feito homem. O problema é que você é tudo que eu sempre quis, mas agora dei pra não querer. Agora resolvi curtir minha vida, eu sou jovem, tenho muita vida pela frente, e não quero me prender em um relacionamento. Entende? “Não, não chora, não faz bico. Não, desculpa. Olha, eu não vou embora tá? Não, não precisa dizer que vai se matar. Não, calma, calma... Eu to aqui, eu não vou sair do seu lado. Deleta tudo, pensando bem, você também é muito especial pra mim, eu odiaria te perder!” E assim, sem querer querendo, não disse não nem disse sim. E iludi mais uma vez por dó, falta de coragem ou por amor – que eu sei que existe, mas custo  aceitar. Sempre critiquei os seres de Marte, mas, de um jeito estranho, agora eu sei porquê os homens preferem a solidão. Como é difícil namorar um homem delicadamente feminino. Como é difícil ser o macho da relação.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Uma noite vermelha


- Alô, quem tá falando?
- Quer falar com quem?
- Na minha época você era mais simpática, mocinha. Não lembra de mim?
- Dá pra falar quem é?
- Nossa Juju, não faz assim não. Fiquei mais de uma hora para descobrir seu número novo e você me trata desse jeito? Sei que já faz tempo, mas deu vontade de saber como você estava..

Desliguei o telefone. A única pessoa que poderia chamar uma menina completamente destrambelhada, que dava três passos e conseguia tropeçar em dois, que aprendeu a cruzar as pernas como mocinha bem tarde, que preferia o all star surrado à sandália de salto, que se escondia atrás das pintas sardentas, enfim, a única pessoa que poderia chamar alguém nada meiga de "Juju" era ele. Não tinha dúvidas, era ele. Nunca fui boa em matemática, mas pelas minhas contas fazia mais ou menos quatro anos que não escutava aquela voz. Quatro anos para esquecer um namoro de um pouco mais de oito meses, e assim como não consegui ir em frente com as aulas de piano, é obvio que não consegui esquecer.
Eu tinha acabado de conseguir uma vaga como estagiária em um escritório de publicidade, fazia dezenove anos na semana seguinte, tinha um namorado perfeito que me amava como uma princesa por mais que eu me visse como o patinho ruivo e feio, estava planejando uma viagem de um ano de namoro que em partes, comemorava as raízes do nosso amor, por outro lado, comemorava com espanto que mesmo depois de eu ter contato para ele que eu tinha síndrome do pânico e desejos noturnos estranhos como cereja azul e cerveja duff, mesmo assim, ele não me abandonou. Ele era um cara corajoso e eu, uma esquisita de sorte. Estava tudo maravilhoso. Naquela paz que se sonha em ter aos dezenove. Um dinheirinho na carteira, um amor na cama, uma liberdade surgindo, uma vida começando.
Sai do escritório às seis com ar de quem é responsável, até que me sentia bonitinha e confortável de sapatilha. Subi no ônibus, reparei que minhas espinhas estavam diminuindo de tamanho. Desci do ônibus, um moço me olhou, podia ser que eu estivesse virando mulher. Entrei no prédio dele, me sentia amada. Cheguei, esperava um beijo enorme. Me assustei. A postura séria, o olhar fugindo de mim, as pernas inquietas no sofá, boa coisa não era. Sentei, não disse nada. Ele ficou em silêncio por mais de dez minutos, respirando fundo para falar e desistindo logo em seguida. Quando já estava entretida contando quantas listras tinha na colcha do sofá, ele soltou em disparada, assim, sem vírgulas e nem pausas:  "vou fazer um intercâmbio de um ano na Itália vou estudar e trabalhar está tudo certo já faz seis meses e não tinha coragem pra te contar tentei desistir meu pai não deixou", só parou quando, por fim, me disse: "desculpa, não sei como a gente fica, vamos ficar mais tempo separados do que já ficamos juntos". Já era uma despedida. Derramei quatro lágrimas, levantei, abri a porta. Ele disse: "Espera!". Eu disse: "Um ano? Acho que não vai dar".
Chorei e morri por dias. Não sei se pela tristeza de ter chegado ao fim ou pelo desespero de ninguém me procurar. Quatro horas, quinze dias, um mês se passou. Nenhum telefonema, nenhuma mensagem. Nenhuma visualização recente no até então famoso orkut. Nada. Não comia mais de tristeza, comecei a ter tonturas. Fui comer um cachorro quente, não me caiu bem. Tive desejo de jaca. Estranhei. Aonde foram parar as cerejas azuis? Fim do mês, nem sinal de azul, nem vermelho. Enjôos. Não sabia como contar a meus pais. Eu estava grávida de um namorado metido a italiano? Eu estava grávida de um ex-namorado que eu não sabia mais onde estava, onde morava, o que andava fazendo da vida? Eu estava grávida de alguém que terminou comigo antes de saber que iria ser pai? Eu estava grávida, simples, sem complemento nem companhia, assim, sozinha. Numa cidade cinza, num apartamento pequeno e sujo, sem saber o que fazer. Eu teria que voltar pra minha cidade nos finais se semana, a barriga não apareceria logo, mas e depois? Desespero. Médica. Exame de sangue. Mais enjôos. Silêncio. Mentira. Não posso voltar esse fim de semana, é, muito trabalho, desculpe. Mais médica. Mais um final de semana sozinha. Ódio, não sei do que, não me pergunte. Da minha vida que estava uma droga, de uma vida nova que eu não queria ou da vida amarga que o levou para longe? Não sei. Ódio.
Sábado a noite, não existia mais balada, o filme acabou, fui levantar do sofá. Dor, dor, dor. Sangue. Desespero. Ligar pra médica. Como assim ela está de férias? O que eu faço agora? Pronto socorro? Táxi. Velho babaca preocupado com a mancha de sangue no acento do carro e não com a moça ensanguentada. Três meses e meio de gestação. Em menos de três horas, a notícia: aborto espontâneo. Tristeza. Quem disse que eu não queria esse bebê? Eu queria sim. Raiva. Dor. Choro. Angústia. Não posso ligar pra ninguém. "Como assim você teve um aborto? Nem sabia que você estava grávida, minha filha". Sofrer sozinha. Me reconstruir, aos trancos. Dor, a lembrança, o pesadelo daquela noite vermelha. Não conseguia esquecer.
Passei por tudo isso, completamente sozinha. Em menos de cinco meses tudo aconteceu: eu era imensamente feliz, perdi um amor, ganhei um bebê, perdi um bebê, perdi o rumo, perdi o riso. Envelheci cinco anos em cinco meses. Olheiras. Expressão triste. Nunca mais ser feliz como antes. A cada riso que sem querer soltava eu imaginava como seria o riso do meu bebê. A cada criança que via brincando na rua, um balde de choro. Com quantos anos ela estaria? Com quem ela iria se parecer? Como posso sorrir, se minha felicidade foi embora antes mesmo de eu a ter conhecido? Arrependimento. Aprender a conviver com isso. Sobreviver apenas, viver, assim: leve e tranquila? Nunca mais.
Quatro anos depois, o telefone toca. Na mesma hora, o mundo acaba. Atender e falar "oi, quanto tempo, como você está? Quase fui mãe de um filho seu enquanto você estava se divertindo entre uma macarronada e outra." ou então "não sei se sofri mais por te perder ou por perder a família que quase tivemos."? Preferi desligar. Não deu certo trocar de número. Trocar o cabelo, trocar de casa, de emprego, de cidade. Não adiantou. Troquei tudo. Tentei me recompor, me refazer, me reciclar. Não deu certo. O pesadelo ainda vivia em mim. E então, depois de quatro anos, o telefone toca. Entre mágoas e soluços, pensei em ligar de volta e despejar toda essa lama na cara dele. Seria culpa dele? Dúvida. Incerteza. A visão da carinha dela. Seria uma menina, eu sei. Ela brincaria na barba dele. Seria bonitinha, mesmo que fosse ruiva como eu. Tristeza. A culpa da vida que poderia ter sido e não foi é de quem? Não sei. Assim como também não sabia quem culpar e por não aguentar carregar tudo isso sozinha, ele foi o premiado. Ganhou o prêmio de se ausentar da dor. Ganhou o prêmio da ignorância. Muitas vezes o "não saber" é um presente. Ele deve estar perdido entre perguntas sem respostas. Quantas vezes a gente tenta entender a vida e não consegue? Sorte a dele. Por ser tão sortudo, eu o acuso. Por causa dele toda essa dor aconteceu. Ele não sabe, mas seríamos felizes, nós três. Mas nunca mais poderemos ser três. Então, desliguei o telefone. Ele nunca entenderá. Melhor assim. Daria tudo para estar no lugar dele e não ter que lembrar todo dia da maldade da vida: te leva aonde você não espera, te transforma no que você não imagina e te faz sentir o que você não queria. Escorreu entre lágrimas e sangue a alegria de Juju.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Pega ladrão


Carro de som, quando não anuncia desgraça, anuncia pamonha. Mas hoje fui levantar da cama e meus ouvidos foram invadidos com aquela voz de quem anuncia que o circo chegou na cidade, dizendo "Não percam, nessa terça-feira, Palestra: como reconhecer um meliante. Técnicas de defesa e fuga! Venham todos, participem". Primeiro eu ri. Depois fiquei pensando seriamente em ir nessa balada aí. Seria muito bom se de cara pudéssemos reconhecer todas as pessoas com potencial a criminoso em nossas vidas. Aquele ali é 171, vou prender ele por estelionato, culpado por obter para si vantagem ilícita (ou seja, foder com a gente e não estar nem aí) em prejuízo alheio (preciso explicar?) induzindo ou mantendo alguém em erro (pois é..) mediante meio fraudulento (chantagem emocional? acomodação sexual? olhos verdes? vai saber..). Aquele outro ali é 157, roubou meu coração com um sorriso. Aquele outro, estuprou meu orgulho. Um conseguiu atirar no meu raciocínio lógico, outro bateu com tudo no carro da minha alegria, me machucou, não prestou socorro e fugiu. Teve também os que traficaram meu juízo, fizeram ele virar pó, me fizeram alucinar e cometer loucuras sem saber o que eu estava fazendo. Por eles, já matei a esperança de ser feliz, já assaltei a confiança dos meus pais, já roubei muitas vezes meu próprio sorriso, já me afundei no erro. Já tive vários tipos de meliante, vários. O foda desses caras é que a função dos desgraçados é, no começo, nunca parecer um meliante. E aí você se joga no mundo deles, vende todo seu luxo pra ficar com aquela simplicidade, esmaga todos seus sonhos pra sonhar junto com uma pessoa, rasga todos os bilhetes de felicidade premiada com um playboy pra ficar, sim, pra ficar a vida toda com um meliante. E depois se pergunta: pra que tudo isso? por que eu fiz tanto? O que eu ganhei em troca? Nada. Melhor ainda, ganhei muito. Ganhei muito pé na bunda, ganhei muita ladainha de amiga chata falando "mude de rumo, esqueça ele, procure outro, vê se enxerga!", ganhei enxaquecas nervosas, ganhei uma caixa d'água de choros, ganhei sogras chatas, ganhei o ódio de umas 78 piranhas, ganhei experiência. Essa última aí foi a que me salvou. A tal da experiência. Depois de ver tanto crime em volta de mim você aprende alguma coisa com a vida. Com ela, eu vi que não adianta bancar a xerifa e querer prender todo mundo na prisão do amor. Meliantes fogem. Meliantes armam um jeito de escapar e não tem algema que dê conta. Não gostam de viver preso, não gostam de honrar fidelidade a nada e nem a ninguém, não gostam de fazer ninguém feliz, só conseguem alimentar o próprio ego e ver envolta do próprio umbigo. E só. E o fim da história sou sempre eu anunciando em todos os postes da cidade "Procura-se por meliante. Recompensa: meu sorriso de volta". Mas não tem que ser sempre assim. Resolvi que  pedi demissão da delegacia. Se lugar de bandido é na cadeia, eu que não vou ficar aqui pra alimentar essa amargura. Não tenho estômago pra continuar mais nessa vida, meu sapato de salto fino enrosca se eu andar apé, minha maquiagem borra se eu tomar chuva, e não dá pra usar cinta liga em visitas íntimas. Não tem jeito, sou muito chique pra ser rainha da favela. Não tenho cara pra usar corrente de ouro presa no pescoço. Prefiro meus diamantes. Soltos, livres e bonitos. Porque realmente acredito agora que deva ser assim. Cansei de tentar prender todo mundo. Não preciso de técnica de defesa, preciso de alguém que me defende. Não quero saber como fugir, preciso que alguém fuja de tudo e encontre em mim a sua paz. Não preciso de garras, eu preciso de liberdade. Preciso de novos ares, preciso sair desse mofo que é a prisão e ver que lá fora céu tá limpo e o sol tá brilhando. Preciso olhar pra padaria, pra farmácia, pra igreja, pra toda a cidade, não preciso só ficar com o cinza que é a delegacia. Não sei aonde estará meu diamante. Não sei que cara tem a felicidade. Não sei por onde começar a limpeza dessas tantas cicatrizes que venho acumulando como colecionadora de desgraças. Não sei. Sei que pedi demissão desse cargo de sofrer. Sei que vou embora agora e não vou olhar pra trás. Sei que é cem vezes melhor ter alguém pra fugir de tudo do que precisar fugir de tudo pra ficar com alguém. Papel de xerifa, mandona, delegada, agende carcerária não me cabe mais. Nunca sonhei com isso, mas ando afim de cerquinhas brancas, dois filhinhos, sainha rodada, blusa de florzinha e vida de menininha. Parece chato, mas depois de tanto bang bang, uma paz é sempre bem-vinda.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Alegriofobia


  
   Alegriofobia. Inventei uma nova categoria daqueles medos absurdos que a gente vê por aí sabe: gente que tem medo de nuvem, de palhaço, pavor de sabão em pó, sei lá. Eu estava morrendo de medo ser feliz. Eu estava tão contente, tão alegre, tão completa, que estava começando a ter pavor de toda felicidade que transbordava em mim. E se tudo for uma mentira? E se não for nada disso? E se acabar? Eu era acostumada com a dor, com o incomodo de nada dar certo, com a certeza de que tudo era ilusão, sujeira e mentira. Eu lido bem com enganos, decepções, traições. Mas o amor recíproco me dava um pânico enorme. Quer dizer que agora chegou o tão sonhado “e foram felizes para sempre”? Quer dizer que agora eu não precisava mais chorar pro travesseiro? Quer dizer que dessa vez eu tinha encontrado tudo que eu sempre quis? Que medo, que medo, que medo! Eu prometi ir com calma, eu prometi não me envolver. Mas não tem jeito. Quando é pra você se apaixonar por uma pessoa, não adianta puxar o freio, não adianta ter cautela, não adianta querer ir aos poucos. Explode tudo dentro da gente. Confunde as certezas, traz inseguranças, dúvidas, aflições, medos. E aqui estava eu. Completamente apaixonada, e perdida, e sem saber se abria um sorriso do tamanho do mundo por ter achado o amor ou se chorava toda desequilibrada por medo de perder esse mesmo amor. O que eu fazia agora? Pra que lado eu corria? Parecia uma criança assustada no meio do fogo cruzado. Eu esperei tanto por isso, eu chorei pra Deus, eu pedi pro anjo, eu implorei pra qualquer força mágica pra que eu fosse imensamente feliz, pra que eu encontrasse alguém que me fizesse sentir que a vida valia a pena, alguém que não me cansasse de estar perto, alguém que fosse meu melhor amigo e meu maior amor, alguém com que eu pudesse cantar com o meu tom mais desafinado, alguém que eu pudesse brincar e brigar, alguém com que eu pudesse ser carente, menininha, meiga, mulherão, assanhada, matraca, quietinha, brava, calma, paciente, irritada, dengosa, charmosa, linda e desarrumada. Tudo. Alguém que eu pudesse ser eu de verdade sem ter medo do que esse “de verdade” pudesse trazer. Eu com defeitos, eu com uma família difícil de se conquistar, eu com os meus ciúmes, eu com meu jeito de criança. Consegui tudo isso. Entendia o significado daquela frase “agradeça pelo que Deus colocou na sua vida”, e eu agradecia tanto, tanto, tanto. Não durmo mais um dia sem falar “meu Deus, acho que não merecia ser feliz assim, obrigada, obrigada, obrigada”. E aí eu tenho vontade de abraçar ele e não soltar mais, como se fosse aquelas crianças que agarram na perna da mãe e não deixam ela andar, não deixam ela se mexer. Eu tenho tanto medo do que poderia acontecer se eu perdesse esse amor que as vezes eu tenho vontade de  mandar ele embora só pra acabar logo com essa história de ser feliz, e de ter um amor, e viver um sonho. Porque eu estou vivendo um sonho. E quando será que eu vou acordar? Não acorde, não acorde. Por favor, viva mais um pouquinho esse sonho lindo, tente imaginar que vai ser sempre assim, feche os olhos e pense: que eu mereça um pouco mais dessa paz, que o vento que te trouxe não te leve embora jamais, que minha vida tenha sido um ensaio de erros pra agora eu acertar, que a tristeza tenha ficado pra trás, que a felicidade ache um lugar pra criar morada, que minha alma não se canse de brilhar e que eu não morra de alegria. É isso que eu peço em oração. E nos dias mais desesperados, aonde o medo me consome o peito, eu peço ainda que eu aguente firme essa angústia de tudo ser só sonho. Eu peço que Deus me proteja de mim, e dos meus medos bobos que me fazem andar em círculos, e que ele me convença de que eu posso sim ser premiada na mega-sena da felicidade. E o mais importante: que ela possa durar mais que 15 minutos e que olho gordo nem inveja braba leve ela de mim. Amém.

segunda-feira, 5 de março de 2012

De te pedir pra ficar

  
     Eu só queria te dizer que todas essas minhas atitudes pra te perder, são, na verdade, um medo filha da puta de te perder. E tudo que eu faço de errado, é uma tentativa desesperada em acertar. Acertar com você, acertar pra você, acertar por nós dois. E eu só queria te implorar pra não ir embora, pra ficar, mesmo que eu seja uma idiota destrambelhada que saia fazendo e falando todas essas coisas que já combinamos que não podem ser feitas e faladas. E sim, eu sei que fecho a cara e não consigo fazer pose de paisagem, e que meu rosto parece um letreiro enorme piscando “estou com ciúmes, não gosto do que você está fazendo, não saia do meu lado, não olhe pro lado”. Eu sei que preciso me tratar. Mas só você pode me tratar. Eu me saro se você disser que ficar do meu lado é tudo o que você mais precisa. Eu me saro se você me chamar de linda. Eu me saro quando eu tiver a completa certeza de que eu sou uma parte muito importante na sua vida. Mas eu nunca tenho certeza. E é essa incerteza que me desespera e que faz eu ter pesadelos. E neles você me detesta, e diz com todas as letras que ficar comigo soa como uma piada, e me usa, e me descarta, e me magoa, e me faz chorar. E eu tenho um medo absurdo de chorar por você. Eu tenho um medo absurdo de querer ficar com você. Eu tenho um medo absurdo de amar você. Mas aí, eu te vejo do outro lado da rua, e olho pro meu celular e você não me avisou que estaria do outro lado da rua. Aí eu te odeio. Aí eu pego a minha cara de “o que significa isso?” e vou falar com você e você me mostra que mandou uma mensagem antes mesmo de eu despejar em você quinhentos mil palavrões e aí eu adoro você. E odeio a operadora do celular. E aí eu me pergunto porquê diabos eu dei pra ficar assim, tensa, desesperada, insegura, ciumenta, nervosa, louca, até você rir pra mim, e tudo passar. E aí me peguei pensando que isso poderia ser um aviso: eu estou gostando de você, aí eu lembro que gostar de você está longe de ser uma boa escolha. E aí eu me odeio. E lembro que fazia tempo que não ficava assim, odiando e amando tudo, em questão de segundos. E pensando como seria bom te ter e não te ter na minha vida. E adorando o dia do nosso primeiro beijo e querendo tanto que ele não tivesse existido. E adorando seu cheiro mais querendo ficar longe de você o máximo que eu puder. E não sabendo o que sentir. Mas já sentindo tanto. E eu sinto mesmo, mas eu sinto é muito, e sinto muito por mim. Porque eu sei aonde esse trem desenfreado que é gostar vai parar: de cara no muro. E eu sei que odiaria ter que te deixar por gostar demais de você. Eu odiaria deixar de gostar de mim pra começar a gostar de você, e odiaria desistir de mim pra tentar seguir com você, e odiaria passar por cima de mim pra ficar ao seu lado. Eu odiaria. Mas eu amaria que você quisesse muito ficar aqui, e que merecesse ficar aqui, e achasse a melhor coisa do mundo ficar aqui, e que enfim, não só quisesse, nem achasse, nem merecesse, mas por fim, ficasse, de fato, aqui. Porque aí eu não precisaria matar três leões por dia por você, eu não precisaria arrancar todos os meus cabelos, eu não precisaria chutar a porta, dar murro na parede, muito menos enlouquecer de ciúmes. Eu só precisaria te fazer feliz. E então, eu só queria te pedir que não me abandone, por mais que eu seja essa louca-neurótica-desequilibrada que eu pareço ser. Eu só queria te pedir que tenha paciência com a minha incerteza pra minha certeza poder crescer. Eu só queria que você entendesse meus erros com um sorriso de “ah, coitada, ela só tem medo dessa coisa que é gostar..” e não me julgasse, não me chutasse, não me abandonasse. Eu só queria te pedir que fique, porque ficando, todos esses meus medos vão sumir. Eu prometo. E nós seremos mais que uma tentativa, seremos uma vitória contra o fracasso que eu mesmo cavo contra o nosso amor. E seremos enfim um amor, não um sonho maluco unilateral de uma menina esquisita. Eu só peço paciência. Comigo, com nós, com a minha loucura. Prometo que no final vai dar tudo certo. Prometo que valerá a pena. Como tem valido, quando você me abraça e os medos, e monstros, e dúvidas somem. Como quando eu tenho certeza, que só ando meio perdidamente histérica desse jeito porquê eu sei que você é tudo que eu sempre esperei. E esperei por tanto tempo e não posso perder. Porque de todas as pessoas que eu perdi na vida, se você se perder de mim, de verdade, tenho medo de não me encontrar mais.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Fim sem ensaio

   
     É difícil ver o fim do amor. Quando foi o nosso fim foi fácil. Você disse que era melhor a gente parar de se ver, eu disse que te amar daquele jeito estava ficando insuportável. Mas mesmo com todas aquelas verdades escancaradas não tínhamos chegado ao fim. Ainda escutava o telefone tocar de madrugada e pensava aliviada “ufa, ele não me esqueceu”, mesmo que eu não atendesse. Ainda via teus olhos me seguindo mesmo que você não abrisse um sorriso e pensava “que bom, ele ainda me enxerga”. Ainda via você gritar na minha sacada dizendo que precisava só de mais uma chance, mesmo eu falando que não, não  tinha próxima chance. Ainda via você cometendo erros, e fugindo do que era certo, e enfrentando brigas, broncas, sermões, por mim. Ainda sentia que mesmo a quilômetros e meses de distância, você ainda fazia parte do meu mundo. Um pouco afastado, torto, errado, incompleto, mas sempre ali. Ainda te sentia. Não tinha dúvidas. Acabou, mas ainda existia amor. Ontem quando te vi, e quando vi seus olhos desviando do meu rosto, e suas costas de costas pra mim, e seu rosto distante do meu.. Ali, ali eu vi que acabou. Ali eu percebi que meu telefone não tocava mais de madrugada, fazia tempo, e eu nem tinha me dado conta. Percebi que quem sempre fez loucuras no meio da noite pra perder cinco minutos comigo, não perdia mais tempo. E quem sempre perdia o juízo, resolveu achar. E deu pra fazer tudo certo. E não errava mais. E não me procurava mais. E não me amava mais. Foi o fim. Em todos os fins você avisou: estou te deixando. Que fim covarde esse. Você poderia me avisar que nunca mais eu ia ver seu sorriso canalha tentando me convencer de que só mais uma noite, depois de tantas, não ia fazer diferença, e que era ridículo eu te dizer não. Você poderia me dizer que nunca mais eu ia te ver dançando na frente do espelho. Você poderia me dizer que seria a última vez que você iria trançar suas pernas nas minhas esquentando meu pé gelado. Você poderia me dizer que seria a última vez que entraria por aquela porta. Você poderia ter me avisado. Ia doer. Mas ia doer menos do que essa surpresa grega. Onde eu vejo o amor da minha vida passando na outra calçada como se fosse um zé ninguém. Mas ele era meu zé preferido, não era ninguém. Foi como receber uma notícia inesperada, foi como levar um susto, foi como levar um soco no estômago, foi como acordar e ver o mundo real. Aquela pessoa que eu estava vendo não era mais o meu amor. Eu não sabia quem era, eu não conhecia, eu não sabia seus gostos, suas manias, seus medos, teimosias. Eu não sabia quem era. Você, que tanto tempo foi tudo se transformou em nada sem que eu pudesse evitar. Você foi caindo grão em grão da minha mão, e quando vi, não te possuía mais. Você simplesmente se reajeitou, e me rejeitou, e deu um jeito de seguir seu caminho sem avisar que eu também precisaria achar um rumo. Covardia. Eu ainda esperava que um dia ou outro você aparecesse, em qualquer noite que a última coisa que eu estaria esperando fosse você. Eu ainda esperava suas desculpas, seu volta pra mim, seu não consigo viver sem você. Eu ainda esperava. E nessa espera não percebi que o tempo passou. E quando o tempo passa a gente se depara com cada mudança. E na mudança a gente não se reconhece mais. Não reconhece nem mesmo o amor que parecia tão sobrevivente, tão entranhando em tudo que eu achava que eu era. Mas eu não sabia mais quem eu era. E a surpresa maior ainda não foi ver que nosso amor tinha mudado, foi ver que quem tinha mudado tinha sido eu, e por isso, não existia mais amor. Aquele amor não se encaixava mais no que você podia me dar, nem no que eu queria receber. Não tinha mais espaço. Eu era uma desconhecida pra você e você um estranho pra mim. Confuso. Estranho. Triste. Depois de tantos ensaios, o fim.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Pular amarelinha e agir feito mulher

Vamos lá, você sabe que não vai ser fácil. Ninguém te prometeu que seria igual brincar de amarelinha. Aliás, se até na amarelinha você precisa desviar das pedras no caminho, na vida que não iria ser diferente. Vai ser difícil, mas também não vai ser o fim do mundo. Chegamos em 2.012, mas o mundo não acabou. Respira, conta até três. É que nem machucado quando se é criança, dói, mas sempre tem alguém pra dizer que não foi nada. Além do mais, depois que casar sara. Foi assim que ensinaram a gente, ? Então. Eu diria que sara na hora que o desgraçado parar de enrolar, e de assoprar o machucado, e de colocar um esparadrapo como se resolvesse, e enfim, decidir casar logo de uma vez com você. Ah, mas se não casar, de um jeito ou de outro, acaba sarando, boba. Senão sarar te arrumo uns remedinhos: tenho vodkarivotril, benzedeira, facebook ou celular com crédito. Te dou todos os meios possíveis pra você fazer uma besteira. Fazer besteira é bom nessas horas. Isso tudo aí amargurado, azedo, esmagado tem que sair de algum jeito não tem? Pois então saia, mas saia você de casa, e deixe, lá dentro, trancado as amarguras. Saia, fique tão desnorteada a ponto de não se lembrar quem é. Deixe a dor doer. Vire pro lado, ache o rapaz simpático, diga pra ele que perdeu um amor. Diga que odeia os homens. Durma com ele. Tente se lembrar quem era o moço simpático que deu um de simpático pra no final da noite dar uma. Ria. Cometa de novo essas loucuras sempre que quiser chorar que nem criança. Mas lembre-se: você não é mais uma criança, e chorava só quando era uma menina, agora não. Não mais. Agora você não pode mais agir feito menina. Se quis ser gente grande, agora trate de agir feito mulher. Agora você ignora, dança, bebe, inventa outro amor. Mas não chora mais. Deixa o amor pra depois do Carnaval, quem sabe pras férias de julho. Você ganhou dois convites para aquela balada e não pode perder sua noite revendo fotos de tudo que ficou pra trás. Vá. E quando estiver tocando a música mais brega da noite, te proíbo de pensar “não adianta nada disso, ainda amo ele”. Porque não ama, amor é ilusão de óptica: você o enxerga mas quando pisca ele desaparece. E você não dá bola pra quem pisca e desaparece, não é mesmo? Nem pra quem te chama de gatinha, mina, gostosa. E pior ainda, pra quem nem se esforça e vai de “psiu” mesmo, não é? Então vira a cara pro amor, oferece uma dose de tequila pra ele. Vira o copo. Vira o jogo. Vira a puta. Quando você era a menina, ele escolheu a vadia. Quando você era vadia, você escolheu a vodka. Quando você escolheu a vodka, ele não escolheu você. Mas não importa. Desce mais uma, e duas, e três. Quem sabe na quarta você não se lembre quem é você, e não se lembre da parte de você que está com ele, e não se lembre dele, e acabe a noite feliz.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Meu sorvete de limão


Nunca soube me entender com a vida muito bem. Sempre, sempre quis muito. Meu maior defeito era querer. Podia ter sorvete de uva, mas eu queria o de limão. E eu chupava uma, duas vezes e via que era amargo, e sabia lá no fundo da alma que era melhor o de uva, mas insistia, só pra não dar o braço a torcer. E chupava sem fazer cara feia, que era pra ninguém desconfiar. E sempre continuei querendo errado. O sorvete, os brinquedos, os amores, as dores, os porres. Sempre escolhendo o pior, sempre, sempre. E a vida falando no meu ouvido "Pelo amor de Deus, me escuta!", e eu nem aí pra vida, só muito aí pra mim, só muito atrás de ser feliz. Sempre assim, nunca soube esperar primavera, verão, outono, inverno. Não, eu corria, atropelava, arrastava tudo. E no verão tudo derretia, e no inverno tudo congelava. E nada dava certo. Não deixava a vida plantar, colher, regar, nascer. Eu queria pra ontem, eu tinha que ser feliz pra já. E correndo atrás da felicidade ela corria pra longe de mim. E querendo muito achar alguma coisa boa eu me perdia de tudo e ficava na merda. E nada, nada nunca dava certo. E de sorvete em sorvete, cresci, virei mulher, continuei correndo atrás do azedo. O azedo que virou homem. Com tantos outros doces, leves, calorosos, eu gostava do menino-limão. Do gosto ruim que era viver no amargo de agüentar o ácido e não ter nenhuma recompensa. E a vida dizia "muda, muda de foco, coloca açúcar, sacode essa sina!", e eu não escutava a vida. E eu tinha quinze anos, e depois dezessete, e depois quase vinte. E ainda continuava com a mesma birra. E se alguém perguntasse "Qual é o seu melhor gosto? Qual é o seu tipo? O que você quer pra vida?", eu respondia que gostava do tipo turrão, com cara de mau, com vida sofrida. Daqueles tipos morenos gostosinhos que enlouquecem metade do quarteirão, te azedam o dia, mas te tiram mil sorrisos, aí você perdoa. Daquela cara de cafajeste mimado assumido. Daquele corpo marronzinho se espalhando no seu cabelo loiro. Mas depois de um tempo você descobre que não adianta fechar os olhos e pensar "meu Deus, como eu queria esse azedume pra mim! Como eu queria te mudar, como eu queria ser sua, como eu queria te mostrar como um troféu e gritar pro mundo que venci, fisguei o morenão!" Mas sabe da maior? Ninguém muda ninguém, todo mundo já vem pronto pra somar, e só. E tentar se somar com outro é se diminuir cada vez mais. E se você achou azedo na primeira mordida não continua, não continua porque no fim da fruta não vai ficar doce do nada. E sua vida não muda do nada. A não ser que você deixe. Porque de repente, assim, de repente, mesmo que você não desconfie, a vida vem e começa a fazer mudanças. E você não entende merda nenhuma. E xinga a vida de ridícula porque do nada, meu Deus, do nada ela muda a rotina, do nada ela tira pessoas que você jamais imaginaria que fosse embora de perto de você, e traz pessoas, que meu Deus, você jamais imaginaria que fosse chegar, se aconchegar, se achegar, ficar, mudar, gostar. E você ainda continua pensando que é passageiro, que é só um gosto doce mais que jajá seu azedinho vai voltar. Mas não volta. E quando volta você tem ânsia, e descobre que se contentou com o horrível muito tempo. E descobre que de tanto você chupar azedo você acaba achando que é de azedo que você precisa. Porque se você comesse merda todo dia você iria achar que precisava de merda pra viver. E se você sonhasse todo dia com um morenão você ia achar que era de um morenão que você precisava pra ser feliz. Mas não, não é assim. Porque um dia vem um gosto bom, um sorriso aberto, uma felicidade limpa. E daí você percebe que a vida sabe muito mais da sua vida do que você. E aí você olha em volta e vê que sonhou a vida inteira com o impossível, fez birra de querer o que não pode, chorou por amar o que não têm. E sofre, e sofre, e sofre. Aí vem a vida e te dá, não o que você queria, mas o que era seu, por direito ou por destino, o que já estava planejado pra ser. E aí você ri, e ri, e ri. E não acredita que tudo, tudo que você desejou um dia, você não tem, e você acha engraçado. Porque sabe que o que você tem é melhor do que tudo que você já desejou. E aí você vê que Deus sabe o que faz. Que a vida sabe o que faz. Que você, você não sabe merda nenhuma. E que precisa parar de desejar tanto pra começar a aceitar o que a vida te dá de bandeja. E descobre que quando a gente insiste demais em uma coisa, e essa coisa não vem, é porque algo muito melhor já está reservado. E depois você enche a boca pra falar que tudo está doce. E aí você pensa, meu Deus, desejei um morenão, errado, azedo, mal-humorado, com problemas de família e me vem um branquelo, certo, doce, com um humor de doer a barriga, com uma família unida.E aí você descobre que o importante não é ter alguém pra te perguntar como foi o dia, mas sim ter alguém que faça seu dia ser feliz. Aí você vê que amar sem limites é papel pra Santa, e que você não precisa ter um amor incondicional pra ser imensamente feliz com um carinho bom. E aí você percebe que amava errado, queria errado, sonhava errado, pensava errado. E aí você muda, sabe que quer muito viver um amor, mas só se for pra ser amada também. Se for pra ser desejada também. Se aceitarem voar junto com você também. Pra que seja doce para os dois. Porque de azedo, já basta todo o resto. E porque gostar de alguém tem que ser doce, senão perde todo o gosto. E no meio dessa plantação de azedo e doce, você se vê feliz. E agradece por nada ser como você sonhou. Por ser melhor. E lê numa traseira de caminhão que a felicidade é incerta. E uma menininha te olha e diz "não tem de limão, pode ser de uva?". E você respira fundo. Aceita o que a vida quer te dar dessa vez. E não, não estou falando de sorvetes..
   

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Rinite de amor alérgico

    Detesto esse povo que me manda esquecer. Tô meio murcha porque minha rinite atacou e lá vem o drama. “Tá triste, né querida? Eu sei, ele te usou, Mas não liga não. Eles são assim mesmo, são todos iguais. Só estão a fim daquilo lá que você sabe né. Você deve estar se sentindo péssima, eu sei, mas vai passar, viu linda?”. É, tô me sentindo péssima, mas é com você despejando mil e umas frases prontas que viu na internet e usa por aí como se distribuísse conselhos excelentes. E não fica assim como? Com esse olho cheio de lágrimas e essa cara de acabada? Eu fico acabada com qualquer poeira. Qualquer filme me faz chorar. Fico acabada com o calor que me deixa mole. E esse povo achando que eu tô sofrendo por homem. Sabe, você sabe, eu odeio poeira. Eu odeio porque poeira me lembra tudo que é velho. E tudo que é velho me lembra ele. Porque ele é velho. Velho na minha vida. E eu não gosto de quem pára na estante do meu coração, junta poeira, atrapalha todo o resto e não serve pra nada. Gosto da casa, da pele, da vida, do coração limpo. Aliás, vivo muito melhor. Depois que descobri que tinha alergia a ele, e que tudo que eu tinha que fazer era limpar esse pó acumulado aqui dentro, ficou tudo mais fácil. Agora não preciso mais de pessoas infelizes me dando conselhos sobre como ser feliz. Agora vou mandar você se ferrar em pensamento e responder que não é nada, é só minha rinite. E me deixa, que eu demoro demais pra sacudir a poeira. Mas quando vou, passo feito furacão, arrasto tudo, não penso mais em sorrisos, em vontades, em passado. Me deixa, que eu tenho meu tempo. Fico anos dando murro em ponta de faca, depois roubo a faca, te rasgo inteiro, e você só percebe quando começa a sangrar. Não dou nem meia volta quando querem que eu dê a volta por cima, mas de repente, o mundo gira, e eu que fui tanto tempo suja, tanto tempo murcha, tanto tempo alérgica, agora vou ser caçadora. Feito aquelas faxineiras que não sossegam enquanto não estiver tudo brilhando. Caçadora, é. Mas sabe do que? Da minha felicidade. Do meu mundo colorido que eu sempre sonhei. Dos dias de sol que respiro bem e sujeira nenhuma afeta minha vida. É só esperar, hoje tô entupida, congestionada, com o peito chiando, com a vida doendo. Amanhã tô pulando, com a vida saltando dos olhos, com a garganta limpa pra poder gritar alto que sou feliz. É, sou feliz. E apesar da minha alergia eu sou alegria. Tá vendo como uma letra faz diferença na vida? É fácil ser feliz. Basta fazer uma faxina de umas ou outras sujeiras que andam por aí com pernas, braços, sorrisos e mentiras.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

A pamonha de Piracicaba

    Regras. Relacionamentos são feitos basicamente de regras. Regra número um: não demonstre estar sentindo o que você está sentindo. Regra número dois: aja sempre do modo oposto ao que você queria agir. E a mais importante, regra número três: brinque sempre de gato e rato. Assim você prenderá alguém na sua ratoeira. Certo? Errado, pelo menos pra mim. Sempre odiei regras, nunca deu certo esse jogo de brincar de estar com alguém. E mesmo odiando, sempre fiz as coisas na ordem certa: começo, meio e fim. Mas pela primeira vez tô amando me relacionar com alguém porque não tem jogo, nem regra, nem coisa certa a fazer. Porque a ordem tá completamente invertida, e olha que irônico, invertida e confortável. É a primeira vez que eu sei que tá tudo errado, mas tô achando tudo muito bom. Tudo “não mude uma vírgula”, tudo em paz. Tô em paz comigo, olha que milagre. Toda vez que aparecia alguém parecia que dentro de mim uma escola de samba começava a tocar, e não parava mais, e não me deixava dormir, e não me deixava acalmar. Dessa vez não teve jeito, não teve freio, não tem parada, tá descendo desenfreado num ritmo que eu não consigo acompanhar. Mas olha que legal, pela primeira vez não faço a menor idéia do que pode acontecer amanhã mas mesmo assim não estou arrancando meus cabelos. E tô morrendo de medo de te perder, mas sei que se te perder não vou morrer. Confuso, mas no fundo é simples. Eu disse não, você disse sim. E na hora que era pra passar o telefone errado eu passei o certo. E na hora de se fazer de difícil eu fui sincera. E quando me perguntou do que eu gostava eu não menti, não disse tudo que um homem gostaria de ouvir, eu disse tudo que eu gostaria que um homem aceitasse. E quando me traiu eu falei que senti. Senti pra caralho seu ordinário. Você não podia ter feito isso comigo, mas eu te perdôo. Te perdôo porque é errado perdoar, mas como eu quero perdoar, eu vou mandar o errado se fuder. E quando era pra falar ponto final, eu falei que queria continuação. E quando você falou já que você quer assim eu vou embora e acabou aqui, eu falei não acabou, me beija, não vai embora, fica aqui. E em vez de você sumir assustado comigo, você ficou. Tudo invertido. E discutimos a relação antes de existir qualquer relação. E dormimos de conchinha antes de transar com você. E me vi sendo tão mais sua do que já fui de qualquer outra pessoa. E era pra ser só mais uma noite, mas fui dormir pensando que talvez tivesse sido a melhor. E você disse que não queria nada sério e estamos quase sério. Tudo errado. Tudo sem sentido. Tudo confuso. Mas eu estou entendendo, no meio das minhas frases contraditórias, no meio de um texto confuso que ninguém entende eu estou entendendo. Pela primeira vez eu estou entendendo o que está acontecendo: eu gosto pra caramba de ficar do seu lado e sinto que você gosta também. E pra que se importar com a ordem correta das coisas? Morri de ciúmes antes de te chamar de amor. Você me disse amor quando eu estava tão puta da vida com você que não queria escutar nada. Prometi que era pra ser com calma. Prometemos, não cumprimos. Somos assim mesmo. Já te conheço. E não tenho medo de você me conhecer. E não tenho medo de falar com todas as letras que entre você e todos os outros, eu escolheria você hoje. E conto minhas piadas sem graças sem medo de você me achar sem graça. E dou risada quando tenho que ser séria. E sou séria no meio de uma brincadeira. E aí brigamos, e fico cinco minutos sem falar com você, depois você me dá uma cotovelada, me chama de chata, eu tento não rir, mas já estou rindo. E não controlo minhas palavras porque você vai escutar o que eu quiser dizer, e se você não gostar, que vá embora. E te mandar embora é a última coisa que eu quero, mas se tiver que ser assim dessa vez vai ser porque até orgulhosa eu ando sendo, e ando gostando de mim primeiro e gostando de você depois. E ando feliz. E ando morrendo de medo de você não me dar bom dia no dia seguinte, de você sumir, de você não me dizer o que eu quero ouvir. Mas você diz exatamente o que eu quero ouvir e eu ganho o dia. E você diz tudo aquilo que eu não queria ouvir e eu tenho vontade de chorar. Mas eu não choro porque as coisas boas estão compensando as ruins. E quando o celular toca de manhã e eu fico brava porque você me acordou, e você começa a brincar com voz de narrador de comercial oferecendo pamonhas de Piracicaba eu sei, de um jeito estranho, que isso foi tudo que eu pedi a Deus. E ando confusa porque não sei mais o que esperar de você, mas o que anda acontecendo é sempre melhor que o esperado. E ando fazendo tudo errado pra ver se dessa vez dá tudo certo, já que todas as vezes fiz tudo certo e deu tudo errado. E quer saber? Obrigada. Obrigada porque é a primeira vez que eu sei que se tudo acabar, que se tudo der errado, mesmo assim, vou morrer de saudade, só que dessa vez, de uma coisa boa.